segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

Condenação à emissão de Normas Administrativas

I.                    Conceito de Regulamento Administrativo
A noção de Regulamento Administrativo não é idêntica para efeitos de procedimento e processo administrativos. No âmbito do procedimento administrativo os regulamentos caracterizam-se por serem normas jurídicas gerais e abstrata – multiplicidade de destinatários e de situações - conforme dispõe o artigo 135º do Código do Procedimento Administrativo (CPA).
Diversamente, no âmbito processual tem-se vindo a considerar, que basta uma destas características – generalidade ou abstracção - estar verificada para se estar perante um Regulamento Administrativo.[1]
II. Acção de Condenação à emissão de normas
O artigo 77° do Código do Processo dos Tribunais Administrativos (CPTA) destina-se a permitir que sejam intentadas ações com a finalidade de condenarem a Administração ao cumprimento do dever de emissão de normas administrativas necessárias à execução de actos legislativos que carecem de regulamentação (artigo 77°, n°1, parte final do CPTA).
Tendo a Administração a possibilidade de atuar ao abrigo de um poder discricionário torna-se necessário aferir se existe uma relação de exclusão entre discricionariedade regulamentar e omissão ilegal de normas administrativas.
Primariamente, importa referir que o poder discricionário regulamentar abarca quer as situações em que a lei atribui a um órgão administrativo a possibilidade de decidir se emite, ou não, um regulamento, quer aquelas em que determina a produção regulamentar, deixando, apenas, à Administração liberdade de definir o conteúdo normativo mais apto à prossecução do interesse público.
Feita esta pequena consideração, pode-se afirmar que “não existe uma relação de mútua exclusão entre discricionariedade regulamentar e omissão ilegal de norma administrativa”[2], na medida em que a imposição legal de criação de um regulamento pode levar a Administração a elaborar outras disposições normativas.
O dever de regulamentar aparece, muitas vezes, ligado à estipulação de um prazo legal para a emanação de normas administrativas, pelo que a sua violação conduz à existência de uma omissão ilegal.
Contudo, o facto de não existir um prazo não significa que a Administração não tenha o dever de regulamentar. Isto sucede no âmbito dos atos legislativos que não são auto exequíveis, e que, por isso, carecem de um regulamento que lhes deem exequibilidade o que faz com que a Administração esteja vinculada a emitir um regulamento (artigo 77º do CPTA).
Nos casos de ausência de um prazo, a jurisprudência tem seguido o entendimento de que cabe ao órgão administrativo competente aprovar, num espaço temporal razoável, regulamentos que sejam necessários à aplicação de atos legislativos.

III. Legitimidade Processual Ativa
O CPTA confere legitimidade ao Ministério Público, aos autores populares (entidades mencionadas no artigo 9º/2 do CPTA) e a quem alegue um prejuízo direto emergente da omissão ilegal de normas para intentarem ações de condenação de normas. Ao primeiro, na medida em que lhe compete garantir o respeito pela legalidade administrativa, os segundos em sede de defesa dos interesses e bens tutelados pela Constituição e os terceiros para defesa de direitos subjetivos.
Agora, coloca-se a questão de saber em que contexto tem um sujeito o direito à emissão de uma norma regulamentar sabendo que: 1) o procedimento regulamentar pauta-se pela iniciativa pública, apesar de os particulares, à luz do artigo 97º do CPA, poderem apresentar ao órgão competente uma petição em que solicitem a elaboração de um regulamento administrativo; 2) a existência do direito à emissão de normas administrativas provém do ato legislativo carecido de regulamentação.
A jurisprudência considera que este direito existe quando da omissão ilegal decorra um prejuízo direto e atual para o interessado (aplica a disposição do artigo 77º do CPTA).
IV. Existência de uma situação de ilegalidade por omissão
 Verificada a existência de uma situação de ilegalidade por omissão, o Tribunal tem o dever de estabelecer um prazo para que a omissão seja suprida (artigo 77º/2 do CPTA). Decorrido este prazo cabe ao interessado intentar uma ação executiva da sentença condenatória (artigos 164º/4, al.d) e 168º do CPTA) que culmina com uma sanção pecuniária compulsória (artigo 169º do CPTA).
A sentença só pode conter a condenação da Administração à prática da norma devida, não podendo determinar o seu conteúdo sob pena de violar o princípio da separação de poderes consagrado constitucionalmente.

V. Bibliografia

 Almeida, Mário Aroso, Manual de Processo Administrativo, Almedina, 2016
Moniz, Ana Raquel Gonçalves, Estudo sobre os regulamentos administrativos, Almedina, 2ªEdição, 2016
Silva, Vasco Pereira da, O Contencioso Administrativo no divã da psicanálise, Ensaio sobre as acções no novo processo administrativo, Almedina, 2ª edição



[1] “ (…) todas as disposições unilaterais que sejam só gerais, ou só abstractas, para além das que possuam ambas as características, são de considerar como regulamentos administrativos.”, Vasco Pereira da Silva, O Contencioso Administrativo no divã da psicanálise , Ensaio sobre as acções no novo processo administrativo, Almedina, 2ª edição, página 413.
[2] Ana Raquel Gonçalves Moniz, Estudo sobre os regulamentos administrativos, Almedina, 2ªEdição, 2016, página 283.

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