Condenação
à emissão de Normas Administrativas
I.
Conceito de Regulamento Administrativo
A noção de Regulamento
Administrativo não é idêntica para efeitos de procedimento e processo
administrativos. No âmbito do procedimento administrativo os regulamentos
caracterizam-se por serem normas jurídicas gerais e abstrata – multiplicidade
de destinatários e de situações - conforme dispõe o artigo 135º do Código do Procedimento
Administrativo (CPA).
Diversamente,
no âmbito processual tem-se vindo a considerar, que basta uma destas
características – generalidade ou abstracção - estar verificada para se estar
perante um Regulamento Administrativo.[1]
II. Acção de
Condenação à emissão de normas
O artigo 77°
do Código do Processo dos Tribunais Administrativos (CPTA) destina-se a
permitir que sejam intentadas ações com a finalidade de condenarem a
Administração ao cumprimento do dever de emissão de normas administrativas
necessárias à execução de actos legislativos que carecem de regulamentação
(artigo 77°, n°1, parte final do CPTA).
Tendo a
Administração a possibilidade de atuar ao abrigo de um poder discricionário
torna-se necessário aferir se existe uma relação de exclusão entre
discricionariedade regulamentar e omissão ilegal de normas administrativas.
Primariamente,
importa referir que o poder discricionário regulamentar abarca quer as
situações em que a lei atribui a um órgão administrativo a possibilidade de
decidir se emite, ou não, um regulamento, quer aquelas em que determina a produção
regulamentar, deixando, apenas, à Administração liberdade de definir o conteúdo
normativo mais apto à prossecução do interesse público.
Feita esta
pequena consideração, pode-se afirmar que “não existe uma relação de mútua
exclusão entre discricionariedade regulamentar e omissão ilegal de norma
administrativa”[2], na
medida em que a imposição legal de criação de um regulamento pode levar a
Administração a elaborar outras disposições normativas.
O dever de
regulamentar aparece, muitas vezes, ligado à estipulação de um prazo legal para
a emanação de normas administrativas, pelo que a sua violação conduz à
existência de uma omissão ilegal.
Contudo, o
facto de não existir um prazo não significa que a Administração não tenha o
dever de regulamentar. Isto sucede no âmbito dos atos legislativos que não são
auto exequíveis, e que, por isso, carecem de um regulamento que lhes deem
exequibilidade o que faz com que a Administração esteja vinculada a emitir um
regulamento (artigo 77º do CPTA).
Nos casos de
ausência de um prazo, a jurisprudência tem seguido o entendimento de que cabe
ao órgão administrativo competente aprovar, num espaço temporal razoável, regulamentos
que sejam necessários à aplicação de atos legislativos.
III.
Legitimidade Processual Ativa
O CPTA confere
legitimidade ao Ministério Público, aos autores populares (entidades
mencionadas no artigo 9º/2 do CPTA) e a quem alegue um prejuízo direto
emergente da omissão ilegal de normas para intentarem ações de condenação de
normas. Ao primeiro, na medida em que lhe compete garantir o respeito pela
legalidade administrativa, os segundos em sede de defesa dos interesses e bens
tutelados pela Constituição e os terceiros para defesa de direitos subjetivos.
Agora,
coloca-se a questão de saber em que contexto tem um sujeito o direito à emissão
de uma norma regulamentar sabendo que: 1) o procedimento regulamentar pauta-se
pela iniciativa pública, apesar de os particulares, à luz do artigo 97º do CPA,
poderem apresentar ao órgão competente uma petição em que solicitem a
elaboração de um regulamento administrativo; 2) a existência do direito à
emissão de normas administrativas provém do ato legislativo carecido de
regulamentação.
A
jurisprudência considera que este direito existe quando da omissão ilegal
decorra um prejuízo direto e atual para o interessado (aplica a disposição do
artigo 77º do CPTA).
IV.
Existência de uma situação de ilegalidade por omissão
Verificada a existência de uma situação de
ilegalidade por omissão, o Tribunal tem o dever de estabelecer um prazo para
que a omissão seja suprida (artigo 77º/2 do CPTA). Decorrido este prazo cabe ao
interessado intentar uma ação executiva da sentença condenatória (artigos
164º/4, al.d) e 168º do CPTA) que culmina com uma sanção pecuniária compulsória
(artigo 169º do CPTA).
A sentença só
pode conter a condenação da Administração à prática da norma devida, não
podendo determinar o seu conteúdo sob pena de violar o princípio da separação
de poderes consagrado constitucionalmente.
V.
Bibliografia
Almeida,
Mário Aroso, Manual de Processo Administrativo, Almedina, 2016
Moniz,
Ana Raquel Gonçalves, Estudo sobre os regulamentos administrativos, Almedina,
2ªEdição, 2016
Silva,
Vasco Pereira da, O Contencioso Administrativo no divã da psicanálise, Ensaio
sobre as acções no novo processo administrativo, Almedina, 2ª edição
[1] “ (…) todas as disposições
unilaterais que sejam só gerais, ou só abstractas, para além das que possuam
ambas as características, são de considerar como regulamentos administrativos.”, Vasco Pereira da Silva, O Contencioso
Administrativo no divã da psicanálise , Ensaio sobre as acções no novo processo
administrativo, Almedina, 2ª edição, página 413.
[2]
Ana Raquel Gonçalves Moniz, Estudo sobre os regulamentos administrativos,
Almedina, 2ªEdição, 2016, página 283.